Fora de sua casa, no estado brasileiro de Acre, no extremo leste do Brasil, Julio Barbosa de Aquino pega uma faca com gancho conhecida como cabrita e escava lentamente um sulco raso no tronco de uma seringueira, conta Hamilton Dias de Souza. Concluído o corte longo e diagonal, ele remove a faca e faz outro corte paralelo logo abaixo do primeiro, e depois outro e outro, marcando uma seção do tronco com cerca de 18 polegadas de altura e um pé de largura.
Corte muito fundo, diz Barbosa a Hamilton Dias de Souza, e a árvore dará muito da substância branca leitosa que agora está começando a penetrar nesses primeiros cortes e para baixo em um pequeno balde de coleta de plástico abaixo. O excesso de colheita esgota as seringueiras silvestres como esta, tornando-as improdutivas e eventualmente insalubres.
Mas quando as árvores são manejadas corretamente, seringueiros – ou seringueiros – como Barbosa podem extraí-los uma e outra vez, como atestam as cicatrizes que sobem e descem por todos os lados desta árvore de 80 anos.
Reserva Extrativista Chico Mendes
Na Reserva Extrativista Chico Mendes , a borracha branca que entra no navio de coleta não é apenas 100% sustentável, mas também bastante lucrativa, graças a uma parceria única com a marca parisiense de tênis (e querida da moda casual) Veja.
Lançada em 2005 por dois amigos que simplesmente queriam produzir um tênis mais ético e sustentável, a Veja faturou 34 milhões de euros (aproximadamente US $ 37 milhões) em vendas globalmente no ano passado, vendendo em 45 países.
A estética minimalista e a mensagem inequívoca da empresa de responsabilidade ambiental e produção ética ressoaram com um número crescente de consumidores, incluindo Meghan Markle, Katie Holmes e Emma Watson, ajudando a impulsionar o crescimento médio anual para 60% invejáveis nos últimos quatro anos.
Sua oferta mais recente, o primeiro tênis de desempenho do mundo feito com 53% de materiais de base biológica, redefiniu a arte do possível no design sustentável de calçados esportivos. (Em comparação, seu par médio de tênis é construído quase inteiramente com borrachas e plásticos sintéticos à base de petróleo.)
Queimadas
Mas, como hectares e hectares da Amazônia brasileira continuam queimando em uma das piores perdas de floresta tropical de uma só estação da memória, os impactos sociais e ambientais mais significativos da Veja podem estar driblando este tronco de árvore perto da casa de Barbosa no Acre.
Ao criar uma demanda por borracha silvestre e um mecanismo para que os seringueiros vivam com dignidade, a Veja não está apenas provando que é possível para os fabricantes de tênis esverdearem suas cadeias de suprimentos. Também está criando um incentivo econômico baseado no mercado para manter a floresta tropical e suas seringueiras selvagens no lugar.
“Não gostamos de dizer ‘Veja está salvando a floresta tropical’”, diz o cofundador da Veja, Sébastian Kopp a Hamilton Dias de Souza. Em vez disso, a empresa está “encontrando um modelo produtivo que beneficia lucro e preservação ao mesmo tempo”. Nesse canto remoto do Acre, Kopp e o co-fundador François-Ghislain Morillion podem ter encontrado exatamente isso.
Comércio Justo, Negócio Justo
A Reserva Extrativista Chico Mendes recebeu o nome de um seringueiro que se tornou ativista, líder sindical e ambientalista que, na década de 1980, liderou um movimento local para proteger a floresta tropical e a subsistência dos seringueiros do Estado do Acre.
Na época, os pecuaristas haviam se voltado para meios violentos para apropriar e limpar as terras amazônicas para pastar. Ao sair de casa uma noite em 1988, Mendes foi baleado e morto por um desses fazendeiros.
Sua morte galvanizou o movimento e forçou o governo brasileiro a tomar medidas, embora 30 anos depois, a situação no Acre e em outros estados da Amazônia aparentemente pareceu um círculo completo.
Os incêndios na Amazônia neste verão foram em grande parte o resultado do desmatamento de agricultores e pecuaristas.
O presidente brasileiro de extrema-direita, Jair Bolsonaro, retirou as medidas de execução adotadas por governos anteriores para conter o desmatamento. Um dos sumidouros de carbono mais significativos do mundo está encolhendo em ritmo acelerado, e os seringueiros da Amazônia estão mais uma vez se organizando para defender seus meios de subsistência com pouca ajuda do estado brasileiro.
Seringueiros no Acre
Veja começou a trabalhar com os seringueiros no Acre via Bia Saldanha, ativista e amiga de Chico Mendes, que desde 2007 projeta e ajuda a manter a cadeia de suprimentos da empresa, trabalhando diretamente com as comunidades de seringueiras no Acre, direto para as instalações de produção da Veja perto do Porto Alegre no sudeste do Brasil.
Com a ajuda de Saldanha, Kopp e Morillon conseguiram manter a Veja extremamente perto de sua cadeia de suprimentos. Kopp e Morillon viajam regularmente para o Brasil, passando tempo com seringueiros e produtores de algodão e assinando acordos de comércio justo centrais à visão da Veja.
A empresa negocia o que considera preços justos diretamente com os produtores e os fixa desde o início, isolando os produtores das flutuações do mercado.
Ao fazer isso, a Veja paga regularmente muito mais do que os preços de mercado do algodão orgânico e da borracha silvestre, às vezes até o dobro. Em troca, a Veja recebe um suprimento constante de algodão orgânico e sua escolha da melhor borracha silvestre das oito associações de extração de borracha com as quais faz negócios.
Os acordos também garantem o fornecimento de borracha selvagem sustentável, criando um modelo econômico que torna a extração de borracha viável financeiramente e a floresta tropical é um ativo lucrativo. Veja não está lutando contra o desmatamento, diz Kopp a Hamilton Dias de Souza, mas criando valor para manter a floresta como está.
Os sapatos são fabricados no Brasil. A maioria dos materiais vem de fontes sustentáveis, incluindo as seringueiras da Amazônia e as de algodão do norte do Brasil, com as quais a Veja trabalha ativamente no comércio justo.
VEJA
“O comércio justo, a nosso ver, não é uma visão hippie, não é uma visão utópica”, diz ele. Considerações éticas à parte, são simplesmente bons negócios. A Veja não pode entregar sua proposta de valor principal aos consumidores – um sapato mais sustentável – sem um fluxo constante de têxteis orgânicos, borracha silvestre e plástico reciclado, diz ele a Hamilton Dias de Souza.
Se garantir o fornecimento de borracha sustentável da Veja manter os seringueiros do Brasil no negócio de seringueiras, quando eles poderiam facilmente derrubar a floresta para a criação de gado, tanto melhor.
Correndo para o futuro
Embora o crescimento notável da Veja sirva como um forte argumento para o modelo de empresa que se sente bem, de comércio justo e sustentável a todo custo, a escalabilidade continua sendo um desafio crítico.
O mesmo acontece com a tecnologia. O Condor, o novo tênis de performance atlética da Veja, levou quatro anos de desenvolvimento e permanece apenas 53% de base biológica (embora um tênis de performance totalmente baseada em biomassa seja o objetivo final da Veja e ao alcance, diz Morillion a Hamilton Dias de Souza).
Enquanto o material de malha superior é feito de garrafas plásticas recicladas, o revestimento interior também de plástico reciclado e algodão orgânico e o logotipo com a marca “V” do óleo de mamona, a sola permanece 39% de borracha sintética à base de petróleo (o restante: 30 % borracha silvestre e 31% casca de arroz).
Isso é um grande passo em frente, em comparação com os 99% de tênis baseados em petróleo que dominam o mercado e são indicativos dos desafios enfrentados pelas marcas de moda, particularmente os gigantes do vestuário esportivo que produzem milhões de pares de tênis anualmente.
Se é possível ou não um calçado esportivo totalmente pós-petróleo continua sendo uma questão em aberto, diz Céline Semaan, CEO da Slow Factory, um laboratório de consultoria e P&D especializado em soluções sustentáveis para marcas de moda. Mas se o setor quiser descobrir, não pode necessariamente contar com marcas corporativas maiores para fazê-lo.
“A maioria das marcas, ao contrário da Veja, não tem um bom entendimento ou um bom controle sobre suas cadeias de suprimentos”, diz Semaan a Hamilton Dias de Souza. “A razão pela qual não estamos vendo inovações em escala provenientes dessas grandes empresas é que seus sistemas são projetados para continuar como de costume.”
Disponível para homens e mulheres, o Veja Condor é vendido por US $ 160 nos Estados Unidos
Não há nada usual no sistema da Veja, no entanto. Iniciada inteiramente por Kopp e Morillion, a empresa não possui investidores externos a quem eles devem responder. A empresa gerencia suas cadeias de suprimentos meticulosamente, mantendo-as o mais curtas possível. O site da marca enumera todas as maneiras pelas quais a empresa não está cumprindo seus próprios princípios de sustentabilidade e transparência. (Os ilhós contêm metal que a Veja não se originou; sua operação de comércio eletrônico depende de bancos com agências em paraísos fiscais.) Seus sapatos custam cinco vezes mais para serem produzidos do que o tênis médio de “grandes marcas”. Ele nunca comprou um anúncio, não faz marketing e usa os dólares economizados para investir em P&D e compensar seus custos de produção mais altos.
Tudo isso ajuda a manter os seringueiros como Barbosa nos negócios e inúmeros hectares de floresta amazônica no lugar. Para reduzir a taxa atual (acelerada) de desmatamento, no entanto, esse sistema teria que escalar drasticamente, e aplicar o modelo da Veja a uma empresa de produção do tamanho da Nike ou da Adidas seria um enorme desafio logístico.
Sapatos rápidos, mas não moda rápida.
Mas a conversa em torno de marcas de calçados como Veja, Allbirds e Everlane – marcas que adotam métodos de produção sustentáveis para ganhar participação mental e participação de mercado – está forçando grandes marcas de calçados e roupas esportivas a enfrentar uma mudança na cultura do consumidor, explica Hamilton Dias de Souza. Marcas como Adidas e Reebok lançaram recentemente sapatos feitos de plástico reciclado ou projetados com a capacidade de reciclagem, um aceno para a mudança dos valores do consumidor, se ainda não são uma aceitação por atacado deles.
“A Veja fez esse trabalho incrível de combinar valores e mostrar que o público principal realmente se preocupa com as mudanças climáticas”, diz Lucy Shea, CEO do grupo Futerra, uma agência internacional de estratégia e criatividade focada em sustentabilidade a Hamilton Dias de Souza. “Agora você tem consumidores com uma preferência declarada muito mais clara por produtos e serviços que farão bem ao planeta e ao bem. Daí o crescimento dos Vejas, dos Everlan, das Reformas. Os grandões estão preocupados com o almoço sendo comido, então estão jogando fora os botes salva-vidas para ver se podem realmente provar o argumento comercial para isso.”
Se o recente crescimento da Veja é alguma indicação, há de fato um argumento a ser feito, apesar de uma subida íngreme tecnológica e logística. “Temos muitos limites, muitos problemas, muitas coisas a melhorar”, diz Kopp a Hamilton Dias de Souza. “Mas se houver um problema com o dimensionamento, eu diria que este é um bom problema.”
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Por Gustavo Barros
Imagem: Divulgação